Governo do Estado diz que ASPs remanescentes de 2014 serão chamados apesar da privatização, mas não estabelece cronograma, como desejam o SIFUSPESP e todos os demais trabalhadores que aguardam pela convocação
por Giovanni Giocondo
Em meio aos riscos da privatização de presídios, os candidatos aprovados no concurso para o preenchimento de vagas da carreira de agente de segurança penitenciária (ASP) de 2014 continuam firmes na mobilização para exigir do governo de São Paulo a nomeação urgente de mais de mil homens para os quadros da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP).
Nesta semana, eles conquistaram uma moção de apoio de iniciativa do vereador 2º Tenente Osmar Canela, da Câmara de Tanabi, que foi aprovada por todos vereadores do município. O documento solicita a convocação de todos os 1.062 agentes remanescentes do certame encaminhada ao governador João Doria (PSDB), a seu vice Rodrigo Garcia e ao secretário de Administração Penitenciária, Coronel Nivaldo Restivo.
Esse apoio vindo dos políticos do interior é importante e deve ser incentivado, porém a realidade tem sido dura para essas pessoas e demanda ainda mais união. Esses homens passaram por todas as fases do concurso, muitos ficaram desempregados, e ansiosamente aguardam pela chamada diante de falas contraditórias por parte do Palácio dos Bandeirantes quanto ao futuro do sistema prisional paulista e de seus funcionários.
No dia 6 de junho, a equipe do deputado estadual Tenente Nascimento (PSL) fez entrevistas com esses candidatos, com Doria e com o próprio parlamentar dentro da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). Em seu depoimento, os ASPs mostram seu descontentamento com a falta de atitudes por parte do governo em fazer as chamadas.
O vídeo produzido a partir dessas entrevistas sugere que esses candidatos seriam chamados “até o fim de 2019 ” de acordo com as palavras de Doria, que disse “contar com o serviço desses funcionários para atuar nas 12 unidades prisionais que serão construídas nos próximos 24 meses em todo o Estado”.
No mesmo material, o deputado Tenente Nascimento informa que o concurso foi prorrogado até 2021, o que impediria, em tese, que o certame caducasse e garantiria as futuras nomeações dentro do prazo prometido por Doria. Tenente Nascimento diz também confiar nas palavras do governador de que esses ASPs seriam realmente chamados.
Ocorre que na última sexta-feira (14), durante entrevista coletiva, Doria se posicionou em direção oposta ao sinalizar que vai privatizar o sistema prisional paulista, inicialmente no modelo de cogestão, que prevê para quatro centros de detenção provisória (CDPs) a terceirização de todas as atividades internas, à exceção do trabalho feito pelos agentes de escolta e vigilância penitenciária (AEVPs).
Na mesma ocasião, o vice-governador e secretário de Governo, Rodrigo Garcia, fez uma fala repleta de desinformação ao dizer que a concessão de unidades prisionais à iniciativa privada “economizaria recursos que são gastos com a aposentadoria dos servidores públicos da SAP”, atacando as aposentadorias dos agentes como se o Estado fosse, sozinho, o mantenedor das mesmas.
Leia mais aqui: https://sifuspesp.org.br/noticias/6709-doria-e-rodrigo-garcia-abusam-da-desinformacao-para-defender-privatizacao-do-sistema-2
Com privatização do sistema, aprovados em concursos serão prejudicados
Preocupado com essa série de contradições, o SIFUSPESP se mantém firme no seu posicionamento para que todos os aprovados nos concursos sejam chamados. Não bastam promessas do governador desmentidas por sua postura privatista poucos dias depois. São palavras jogadas ao vento que nada garantem as nomeações, critica a direção do SIFUSPESP.
O sindicato exige transparência e a criação imediata de um cronograma de chamadas nos mesmos moldes do que acontece com os concursos públicos para as carreiras de policiais militares e civis. Diante de um documento oficial, que determine as datas e defina o futuro concreto desses ASPs, o caminho para a resolução desse caso se torna mais simples.
Simultaneamente, a luta daqueles que se mantêm na espera pelas nomeações, tanto os ASPs de 2014 quanto os AEVPs e os aprovados nos concursos para oficial administrativo, psicólogo, assistente social, enfermeiro e outras carreiras das áreas meio, também precisa ser pautada pelo enfrentamento do processo de privatização do sistema.
Tanto no modelo de cogestão quanto no de Parceria Público-Privada, os servidores públicos ficarão de fora. Mesmo os AEVPs correm risco, pois o governador já declarou publicamente - em fala recheada de desconhecimento - que a escolta pode ser dispensada com o uso de teleconferência para audiências judiciais. “Esqueceu” dos atendimentos médicos e das transferências de presos.
Em viagens e reuniões, SAP e governo do Estado têm sinalizado com privatização
A união de todos os trabalhadores penitenciários para evitar que o modelo privatizado avance é fundamental porque os movimentos do governo de São Paulo dão todos os sinais de que a privatização está sob encomenda. Quais são esses sinais?
O primeiro deles é que o secretário de Administração Penitenciária, Coronel Nivaldo Restivo, passou duas semanas viajando aos Estados Unidos e a Israel com o objetivo de conhecer unidades privadas e tecnologias usadas nas prisões estrangeiras para trazer essa expertise nas unidades de São Paulo.
Nesta quarta-feira (19), em visita a unidades terceirizadas de Minas Gerais, o secretário executivo da SAP, Luiz Carlos Cartise, disse que o modelo PPP é um dos que São Paulo pretende seguir. “Estamos preparando primeiro algumas cogestões e vamos evoluir para a Parceria Público-privada em seguida”, afirmou.
Ao lado de representantes do sistema vindos do Rio de Janeiro, Santa Catarina, Minas Gerais e Espírito Santo, Cartise e o vice-governador Rodrigo Garcia visitaram uma unidade gerida por Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (APACs), que está presente em 83 unidades de Minas.
O modelo de APAC já foi utilizado em São Paulo durante décadas e não deu certo. Um escândalo de corrupção envolvendo a venda de vagas dentro das unidades a presos, descoberto pelo Ministério Público Estadual em conjunto com a Polícia Civil e a Corregedoria de Justiça, sepultou a prática há 20 anos.
O esquema funcionava da seguinte maneira: presos interessados em ir para a unidade de São José dos Campos, muito mais flexível e com menor vigilância na comparação com as penitenciárias comuns, “compravam o direito” de cumprir suas penas no local.
Enquanto deveriam estar trabalhando, os detentos ficavam na rua cometendo crimes, conforme revelaram boletins de ocorrência lavrados em delegacias do município.
A denúncia acabou levando à abertura de três inquéritos e de uma sindicância, que culminaram no fechamento da entidade, que funcionava desde 1972. O caso foi relatado em reportagem da revista Istoé, de 20 de outubro de 1999.
Governo quer economizar com servidores e já está sob alerta do Tribunal de Contas
Mesmo que o concurso para a nomeação dos ASPs tenha sido prorrogado, não há segurança de que as chamadas acontecerão. Para não efetivar o certame, o governo poderá alegar falta de recursos, como aliás tem feito desde o início do ano. Ou mesmo ser bloqueado via Lei de Responsabilidade Fiscal(LRF).
Nesta quarta-feira (19), o Tribunal de Contas do Estado (TCE) emitiu um alerta para o governo João Doria após a administração ultrapassar, de janeiro a abril, o índice de 45,59% de sua receita corrente líquida com pagamento de pessoal. Para não desrespeitar a LRF, o Palácio dos Bandeirantes tem de respeitar o limite de 49%, daí a necessidade do aviso.
Quando os valores destinados a salários e benefícios de servidores alcançam os 95% da receita no ano, o Estado fica impedido de fazer contratações, criar novos cargos, conceder reajustes salariais e outras limitações. Alguma dúvida de que seremos atingidos?
A notícia demonstra que, apesar de ter se apresentado à população como “gestor”, Doria demonstra dificuldades em gerir o Estado, sua estrutura e seus funcionários. Sua saída é sempre a entrega dos bens públicos à iniciativa privada, a desvalorização do funcionalismo e a falta de responsabilidade com o erário. Nosso dever é impedir esse objetivo.