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“Diante de tão belas folhas em branco resolvi

escrever poemas”.

(Do livro Balaio de Gatos de Marc Souza)

 

Sensibilidade. Não é o que se espera de um agente de segurança penitenciária ou ASP, como são conhecidos no Estado de São Paulo. Afinal no trabalho exercido  por ele considera-se a dureza. Muitos agentes contam que a partir do momento que se entra em uma unidade penitenciária faz-se necessário mudar a postura para obter respeito dos presidiários. Além de ser fundamental para a sobrevivência, já que existe uma pressão diária enfrentada por esses profissionais responsáveis pela “guarda” daqueles que foram condenados a cumprir pena, conforme a Lei de Execução Penal (LEI).  

 

Marc Souza também é colunista do Portal SIFUSPESP, único local onde dedica-se a escrever sobre o sistema prisional, num outro ritmo e estilística. Descreve de maneira crua ansiedade, medo, precariedade, gente demais dentro das grades, crime organizado, rebeliões e morte. Vida dura. Essa parte da vida de Marcelo Otávio de Souza, ASP que trabalha no Centro de Detenção Provisória(CDP) de Dracena é deixada de lado nos momentos fora dos muros da cadeia. Ele é um homem de sensibilidade, escritor de poemas e crônica, com três livros publicados: Casos Acasos e Descasos - várias variáveis de uma vida sem graça, Fatos Relatos e Boatos, e Balaio de Gatos.

 

“Fiz uma pintura

Uma obra de arte talvez

Abstratas

Daquelas que não se entende

Daquelas

Que só se sente”

 

Seus poemas e crônicas tratam do cotidiano e contém palavras exatas, como se fossem colocadas com uma pinça. Possui uma linguagem de linhas enxutas, contando a vida com humor, um certo cinismo e acidez - “Ela destruiu os meus sonhos. E eu... Eu... Eu nem liguei! Fui à padaria e comprei sonhos novos. Fresquinhos, fresquinhos”. Além de falar do amor - “Naquela noite sorriram, choraram e se amaram pela última vez amor” - do prazer, e falando da própria Língua Portuguesa, ““Puta que pariu!” é um patrimônio nacional. Um patrimônio da língua portuguesa” -. da qual é amante e “voraz consumidor”, conforme dito por ele.

 

Em seus livros, é clara sua paixão pela literatura. Como escritor, ele é Marc Souza e registra textos em uma linguagem caracterizada como contemporânea -“Esquecemo-nos de nossas origens, do nosso nome. Esquecemo-nos de nós mesmos. Com a intenção de causarmos grande impressão, criamos personagens fictícios, que, por mais que nos esforcemos, nunca o seremos”, ao mesmo que aparenta um saudosismo quase escondido pela língua culta, utilizada em outras épocas. Ou seja, Marc não banaliza e é conhecedor do nosso bom Português. Quem sabe por meio da leitura de ícones literários como Machado de Assis e Eça de Queiroz, entre tantos outros.

 

A leitura é fluida, saborosa, interessante e surpreendedora. Marc Souza transborda de alegria nesta necessidade boa de extravasar sentidos no papel que hoje tornou-se tela. Ele fala da família de hoje, do despedaçar da mesma, do sempre, e saúda o passado presente na memória de quem viveu criança na rua, nu dos eletrônicos que nos fazem ausentes, conforme seus textos, conforme seu coração - “Bons tempos aqueles em que para sermos felizes bastava-nos uma bola velha e uma imaginação sem limites.”

 

Nesta trajetória de belos escritos, de Arte Literária, Marc Souza já foi premiado algumas vezes e costuma participar de concursos que exaltam a escrita brasileira com uma nova geração de escritores. E é comprovado desde muito tempo que sejam eles quem forem, não importa o ofício, mas a dedicação à paixão da escrita. A armadura do agente penitenciário cai por terra nos momentos de liberdade. Sem ansiedade ou medo, sem lidar com a possibilidade da morte ou do peso da vida, tão presente nos corredores da prisão. Um personagem? Marcelo parece ele mesmo quando Marc, porém livre de qualquer amarra.

 

A literatura como esperança por Marc Souza

Palavras e sonhos do escritor, vindas de uma entrevista realizada pelo SIFUSPESP, aqui registradas na íntegra para não desperdiçá-las num formato jornalístico pobre e distante dele

 

Um bom texto faz pensar. Um bom texto tira você do ambiente comum, mostrando novas perspectivas, trazendo novas idéias, criando opiniões. E isso é lindo. É libertário.

Eu tenho um projeto que em alguns anos pretendo colocar em prática: um curso gratuito de literatura criativa para pessoas carentes.

 

Acredito que assim poderemos mudar, não só o ambiente que estes vivem, mas também a comunidade em que estes vivem. Porque por meio da leitura e da escrita você começa a pensar o meio em que vive. Você começa a analisar e buscar soluções para o meio em que vive. É uma formação de seres pensantes e atuantes.

 

Eu acredito que quando pudermos fazer com que compreendam o poder que tem a literatura de fato, toda amarra do nosso povo soltará, porque quem lê, pensa. Isso é fato .Quem lê pensa. Analisa. Entende. E quando você passa a entender o mundo em que vive, também passa a fazer parte dele com consciência e tende desejar mudá-lo para melhor.

 

Eu não posso falar que a literatura é uma válvula de escape, porque na verdade eu criei um alter ego. Existe o Marc Souza escritor e o Marcelo Otávio de Souza, agente de segurança penitenciária. São as mesmas pessoas, mas não são. Procuro separar os dois.

 

Tenho o sonho de escrever um dia um romance, no entanto, hoje, só escrevo contos e crônicas. Considero que seja a maneira mais fácil de introduzir uma pessoa nas letras.

Tratam-se de textos curtos, simples, diretos. Em um país onde não há uma cultura literária, quando uma pessoa começa a ler a descrição de um pôr de sol com uma duas folhas, ela abandona o livro e deixa de lado. Por isso hoje escrevo contos e crônicas.

 

Desde garoto eu tenho profunda paixão por histórias. Meu pai era um grande contador de histórias e eu ficava fascinado com as histórias que ele me contava... Meu primeiro contato com a literatura deu-se através da série vaga-lume que a minha professora de sexta série nos obrigava a ler. Eu simplesmente adorava ler aqueles livros.

 

Eu fui crescendo e sempre pensava em escrever. Criava histórias na minha mente, mas nunca passava no papel. Então eu descobri o site recanto das Letras. Nele eu criei o Marc Souza e passei a escrever contos e crônicas. Mas ninguém sabia disso. Acho que devo ter mais de trezentos contos, crônicas e poesias escritos lá. Eu morava em Birigui e fiquei sabendo de um concurso lá sobre os cem anos da cidade. Foi quando resolvi escrever um conto e uma crônica em homenagem a cidade. Mas, sem nenhuma intenção de ganhar, fiz por fazer. Resultado: Segundo lugar em contos e terceiro em crônicas. Esse concurso fez com que eu resolvesse fazer uma coletânea de contos e crônicas que resultou no meu primeiro livro: Casos Acasos e Descasos - várias variáveis de uma vida sem graça.

 

Não parei mais.

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