Unidade prisional administrada pela empresa Umanizzare voltou a ser alvo de carnificina, pouco mais de dois anos após caso em que 56 detentos foram assassinados por rivais
por Giovanni Giocondo
Terminou em mais um massacre nova rebelião de presos registrada neste domingo, 27/05, no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) em Manaus, capital do Amazonas. Ao todo, 15 detentos foram mortos por outros sentenciados enquanto durou o motim. Privatizada, a unidade prisional é a mesma onde, em 1 de janeiro de 2017, presos assassinaram 56 rivais durante outra rebelião.
O COMPAJ é administrado pela Umanizzare, empresa privada que recebe recursos do governo do Estado do Amazonas para prestar serviços de segurança e custódia dos detentos na unidade, que tem capacidade para 900 presos.
De acordo com informações de Naldo Silva, presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Estado do Amazonas (SINSPEAM), o número de mortos no motim deste domingo só não foi maior graças à ação do Grupo de Intervenção Penitenciária, que conseguiu conter parte dos ataques. A equipe foi criada pelo governo do Estado à semelhança do Grupo de Intervenção Rápida (GIR) de São Paulo, após o massacre de 2017 .
Ainda conforme informações do SINSPEAM, a rebelião teve início durante o horário de visitas de familiares aos presos, e teria como uma das causas o conflito aberto causado pela mudança de lideranças de uma das organizações criminosas que atuam no sistema penitenciário do Amazonas.
Privatização insegura, ineficaz e mais cara
O modelo de terceirização foi apontado como uma das causas do massacre anterior, sobretudo pelo fato de não haver vínculo entre os funcionários e o Estado, resultando em baixos salários e alta rotatividade de postos de trabalho na unidade.
De acordo com investigação finalizada em novembro de 2017 pela Força Tarefa da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Amazonas, dois agentes de ressocialização ligados à empresa e policiais militares confessaram participação em um esquema de entrega de armas de fogo, facas e celulares aos presos mediante pagamento de propinas.
Leia mais no link: https://www.sifuspesp.org.br/noticia/nacionais/4765-pms-e-agentes-repassaram-armas-a-presos-que-massacraram-rivais-em-manaus
Após fazer uma devassa nos contratos entre governo do Estado e a Umanizzare ainda em 2017, o Ministério Público Estadual constatou que o modelo de terceirização do COMPAJ era “ineficiente, caro e inseguro”. Desde 2015, a empresa recebeu do governo do Amazonas um total de R$ 836 milhões, o equivalente a 76,6% do orçamento da Secretaria Estadual de Administração Penitenciária (SEAP).
A ocorrência de mais um caso bárbaro de violência entre os detentos da unidade terceirizada pode significar a saída da Umanizzare do Amazonas, apesar de o contrato da empresa com o Estado ter sido prorrogado sem licitação em 18 de dezembro de 2017, com o custo mensal de R$ 3,4 milhões.
De acordo com relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicado em 2017, cada preso das unidades prisionais do Amazonas custava aos cofres do Estado o equivalente a R$ 4,9 mil por mês. O documento afirma que apesar desses números vultuosos, a administração penitenciária no Estado possuía diversas falhas, principalmente na segurança, com a ocorrência frequente de rebeliões e fugas;
Informações apuradas pela assessoria de comunicação do SIFUSPESP dão conta de que a gestão do governador Wilson Miranda Lima (PSC), que assumiu em 2019, estuda a realização de concursos públicos para o preenchimento de vagas para agentes penitenciários e outros cargos como forma de retomar a administração do Complexo.
Riscos para São Paulo
A empresa pode sair do Compaj, mas é uma das interessadas no edital aberto pela Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) para a cogestão dos Centros de Detenção Provisória (CDPs) de Gália I e II, Registro e Aguaí, todas no interior de São Paulo. A Umanizzare inclusive enviou representantes à audiência pública convocada pela SAP para debater a concessão dessas unidades, no último dia 6 de maio.
O presidente do SIFUSPESP, Fábio Jabá, alerta a população de São Paulo sobre os riscos que a presença de uma empresa terceirizada pode simbolizar para a administração do sistema prisional do Estado.
“Os péssimos exemplos de prestação de serviços da Umanizzare e de outras empresas privadas no Amazonas, e em outros Estados onde aconteceram massacres entre presos, demonstram que o sindicato está com a razão quando demonstra com fatos notórios que o modelo privado é mais caro e coloca a população na mira da criminalidade. É este o modelo de gestão penitenciária que o governo Dória quer trazer para São Paulo?” questiona o sindicalista.
A Federação Nacional Sindical dos Servidores Penitenciários (FENASPEN) esteve presente na audiência pública, realizada nesta quinta-feira (09/05), pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, em debate sobre a reforma da Previdência do ponto de vista dos agentes de segurança pública. Além do presidente da Federação, Fernando Anunciação, órgãos representantes de categorias diversas ligadas a segurança pública participaram da discussão.
Fernando Anunciação fez um balanço positivo de sua participação na reunião, presente para demonstrar a importância dos servidores do sistema prisional para a segurança pública como um todo, explanou a respeito da natureza da atividade realizada pela categoria, e por isso do direito a um tratamento igualitário com as demais categorias policiais. Reafirmou a necessidade do reconhecimento do servidor penitenciário como parte de uma Polícia Penal.
“Somos os únicos que estão dentro dos presídios, fechados com os apenados e a sociedade não nos vê. Não apenas a sociedade não entende nosso trabalho, mas muitas autoridades também desconhecem o que fazemos e quem somos ou não querem entender a condição e a situação de um agente penitenciário dentro de uma unidade penal”, afirmou o presidente da Federação durante a audiência. Ele ainda relembrou a luta de embate ferrenho da categoria no ano de 2017, durante o governo de Michel Temer:
“Tenho certeza que não precisaremos chegar no ponto que chegamos na Reforma passada. Nós sabemos o que foram aqueles dois últimos dias da Reforma. Tivemos que ocupar o Ministério da Justiça, chegamos ao extremo de ter que invadir aquela comissão especial e paramos a votação daquele dia. Foi a noite em que travamos a tramitação da Reforma da Previdência passada. Não fosse nossa ação, tenho certeza que no dia seguinte a Reforma teria sido votada e aprovada no Plenário, porque já estava tudo traçado”, lembrou Anunciação.
O presidente da Federação ainda disse na audiência, acreditar que os parlamentares tanto que iniciaram o primeiro mandato em 2019, como os reeleitos, têm a consciência de que o Sistema Penitenciário é parte da segurança pública, e uma parte essencial. Como representante do governo federal, esteve na audiência, o General Girão(PSL) afirmando que é possível melhorar o quadro para os servidores penais.
“Vamos em frente, unidos, que conseguiremos reverter parte desta situação que ainda está pendente na parte da previdência que nos diz respeito. É inadmissível essa competição de morte, das categorias; quem morreu mais ou quem morreu menos. Nós sabemos que somos todos iguais, o risco é iminente para quem faz parte da segurança pública. Nós temos razão de existir dentro da segurança pública”, rebateu os fracos argumentos que tentam deixar de fora da Reforma os servidores penais.
Na oportunidade, o presidente da FENASPEN convidou os presentes e todos os demais que fazem parte da segurança pública ou representam as categorias nela envolvidas a estar presentes no dia 29/05 na Comissão Geral, dentro do plenário da Câmara, quando voltará a ser discutida a Polícia Penal, a PEC 372/2018. Reafirmou que a Segurança Pública é sinônimo de Sistema Penitenciário. E lamentou a ausência dos profissionais agentes socioeducativos terem ficado de fora na votação final do Sistema de Segurança Pública Unificado (SUSP), projeto aprovado no final do ano de 2019.
“Necessitamos de união. O agente socioeducativo trabalha onde está “nascendo” o criminoso. Então será alguém que virá para o Sistema Penitenciário lapidado num momento em que ser bandido é profissão. O socioeducativo está envolvido nesta situação e nós precisamos estar unidos e entender que a segurança pública funciona entrelaçada e com setores interdependentes. Necessitamos que confiem no nosso trabalho e reconheçam importância na sociedade. Seremos Polícia Penal!”, concluiu.
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