Governador utiliza-se de advogados para arrumar brechas na lei e fazer valer medidas que sucateiam serviço público, e transporta ações da Prefeitura para o governo do Estado a fim de estimular privatização
A recente decisão do governador João Dória(PSDB) de vetar o projeto de lei que concederia assistência especial em saúde para policiais e trabalhadores penitenciários vítimas de violência no exercício da função não foi a primeira e nem será última medida adotada pelo tucano com base em brechas na legislação que visam a prejudicar o servidor público e o serviço fornecido pelo Estado à população.
Aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo(Alesp) em novembro de 2018, a proposta do deputado estadual Raul Marcelo(PSOL) “garantia atendimento médico, tratamento psicológico e terapêutico prioritário à vítima e a seus familiares e meios para proteção ao policial ou agente penitenciário que tenha recebido ameaça ou tenha tido sua família ameaçada”.
Na justificativa do veto, o governador acionou sua vasta equipe jurídica para utilizar da prerrogativa de que esse modelo de projeto deveria partir de iniciativa do Poder Executivo e não do Legislativo. A medida revoltou a classe de policiais civis, militares e trabalhadores penitenciários, muitos dos quais ludibriados pelas promessas de campanha de Dória de que as categorias seriam valorizadas em sua gestão.
Ocorre que esse modelo de governo baseado no amparo em excesso de arcabouços legais que visam a gastar menos recursos públicos e sucatear o funcionalismo e consequentemente, o atendimento à população que mais precisa, já vem sendo o modus operandi de Dória desde que ele assumiu o comando da Prefeitura de São Paulo, em janeiro de 2017, tendo abandonado o cargo para concorrer ao Palácio dos Bandeirantes.
O caso das creches administradas pela Prefeitura de São Paulo
Nesse sentido, uma das experiências mais nefastas promovidas pelo tucano na administração municipal se concentrou na educação infantil. Assim que assumiu o cargo, e com a promessa de campanha de zerar a fila das creches para crianças entre zero a 3 anos - que sempre foi um problema grave para diferentes prefeitos da capital - tomou uma atitude que prejudicou professores, pais e crianças de faixa etária superior.
E como isso aconteceu? A Lei de Diretrizes e Bases(LDB) estabelece que o Estado deve oferecer o ensino público e gratuito a crianças entre zero e 5 anos para a educação infantil. Em seu artigo 29, expressa que a educação infantil tem como finalidade ‘o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade”.
Uma das metas do Plano Nacional de Educação(PNE) aprovado em 2014 foi a de universalizar a educação infantil na pré-escola para crianças de 4 e 5 anos até 2016 e estimular o acesso de todas as crianças de zero a 5 anos à educação em tempo integral, com jornada mínima de 7 horas e máxima de 10 horas, indicado sobretudo àquelas provenientes de famílias sob risco, alta ou média vulnerabilidade sociais.
O atendimento a essas crianças mais pobres é feito nos Centros de Educação Infantil(CEIs), com jornada integral, e nas Escolas Municipais de Educação Infantil(EMEIs), sob jornada parcial, de no máximo seis horas. Nos CEIs, devem estar as crianças de zero a três anos e de até cinco anos e 11 meses, caso a gestão siga as diretrizes do Plano Nacional de Educação citadas no parágrafo anterior.
Parte das CEIs paulistanas, apostando no desenvolvimento completo das crianças dentro dessa perspectiva, haviam sido orientadas até 2017 a manter todas sob jornada de tempo integral, mas foram confrontadas por Dória. A comitiva de advogados do prefeito, alegando que a legislação não “obrigava” as creches a atender crianças de 4 e 5 anos em tempo integral, entrou na Justiça para transferi-las compulsoriamente para os EMEIs em 2018.
Assim, um grande número de pais e mães que trabalham sob jornadas tradicionais de expediente, durante todo o dia, perderam o direito que tinham de ter as crianças no período integral para que o prefeito pudesse cumprir sua promessa de campanha. Não houve um período de transição. A operação toda durou três meses.
Algumas dessas pessoas perderam o emprego para ter de ficar com os pequenos. Outras passaram a ter de levá-los ao local de serviço, gerando problemas graves de insalubridade denunciados pelo Ministério Público do Trabalho e pela Defensoria Pública. Outra opção foi deixá-las com parentes sem qualquer preparo para cuidar dos meninos e meninas. Alguns tentaram lutar na Justiça, mas foram derrotados pela poderosa equipe jurídica do prefeito.
Não bastasse isso, as CEIs de Dória passaram a receber de uma vez só a grande demanda reprimida que havia de crianças de zero a 3 anos sem investimentos, melhorias estruturais, tampouco contratação de novos educadores, equipes de limpeza e de manutenção.
Doria incluiu grande número de novas crianças nas creches, mas com que qualidade? Gerou números, fez a publicidade de sua gestão e ficaram todos com uma educação igualmente ruim. Uma democracia dos prejuízos.
Até porque algumas CEIs e EMEIs, já há muitos anos geridas por Organizações Sociais(OSs), possuem uma disparidade abissal de qualidade a depender do poderio financeiro da entidade. As que não contam com esse auxílio e só dependem dos recursos do município, estão em situação ainda pior com a falta de investimentos de Dória.
O déficit precisava ser zerado? Sim. Mas por que não com a construção de mais escolas, com a contratação de mais professores, com mais alocação de recursos financeiros para melhorar o atendimento nos espaços que já existem? Porque a intenção final de Dória é privatizar tudo o que puder, inclusive a educação e a segurança.
Qual a relação entre as duas decisões?
Apesar de se tratarem de dois casos que envolvem setores diferentes da administração pública - educação e segurança - as decisões tomadas por Dória com base em prerrogativas legais demonstram um esforço hercúleo do ex-prefeito e agora governador em economizar o máximo de recursos públicos possíveis para tornar impraticável a rotina dos servidores e causar danos colaterais à população.
Impedir servidores da segurança pública de ter um atendimento diferenciado quando vítimas de violência ou ameaça apenas porque “o projeto deveria ser feito pelo Executivo” é uma medida mesquinha e de desrespeito ao trabalho tão árduo efetuado por agentes penitenciários e policiais, que constantemente são os principais alvos de violência do crime organizado ou dos criminosos comuns. Essa é uma necessidade urgente.
Tão mesquinha quanto escarafunchar a lei para prejudicar pais de família que precisam trabalhar durante todo o dia, tirando de seus filhos o direito de permanecer na escola em tempo integral para atender a uma demanda marqueteira e que disfarça a mentira do mau atendimento a todos.
Na França, sim na França!! como em outros países em que as reformas já avançaram, policiais têm sofrido já os impactos, e muitos, mesmo em um país de primeiro mundo tem cometido suicídios semanalmente, por causa do aumento de pressão, da lógica de metas, e aumento da carga de trabalho. Enquanto o governo privatiza tudo.
Veja mais em: https://www.dw.com/pt-br/pol%C3%ADcia-francesa-enfrenta-onda-de-suic%C3%ADdios/a-46787870
Essa é uma realidade que já ocorre na segurança pública de São Paulo, com suicídios e mortes de policiais e penitenciários. Devemos ter em conta que a privatização dos presídios inicia um processo sem volta para todo este sistema.
Gente como a gente, atingida diretamente pelo mesmo personagem que com sua face de gestor, vai judicializando as políticas públicas e modelando um conteúdo de ação voltado a tornar o serviço público sucateado, mal feito, com funcionários descontentes e mal remunerados, ao qual a população passa a ter ojeriza e achar, equivocadamente, que não é bom por culpa dos servidores, quando o é graças às medidas daquele que os comanda.
O SIFUSPESP somos todos nós, unidos e organizados. Filie-se.
Por:Luiz Marcos Ferreira JR.