Entenda o ataque ao sistema penitenciário e o discurso sensacionalista do medo como arma para privatizar o sistema
Realidade Brasileira: lei seletiva, ataque ao serviço público e modernização do crime organizado
A realidade brasileira, tanto quanto a dos demais países da América Latina, apresenta um regime de condução da segurança pública e da gestão penitenciária em que vigora a aplicação seletiva do exercício da lei penal para setores sociais específicos, a vontade pessoal em muitos casos, a insegurança política e processos de corrupção, informalidade em muitos setores, o que no caso do sistema penitenciário gera como consequência muitos atos de assédio moral dentro dos espaços de unidade penitenciária contra os trabalhadores do sistema.
Somado a isso o crime cada vez mais se sofistica em sua organização.
Essa excepcionalidade da lei atinge diversos setores, e com o aprofundamento da crise política e econômica tem aprofundado a falência do Estado.
Nos últimos anos, o modelo de atuação do crime organizado tem se adaptado a organização do crime organizado que amplia negócios e atua na exploração da população carcerária e das famílias destas pessoas em bairros populares. Este modelo atual de ação do crime organizado está deixando o carácter da informalidade e convertendo-se em um modelo empresarial para exploração de ilegalidades, inclusive associando-se a organizações e negócios vinculados ao setor da segurança pública e penitenciária, um risco que se amplia com a privatização.
No sistema penitenciário, ainda que nos tempos de crescimento econômico, o número de encarcerados aumentou e não se viu mudança estrutural no sistema.
O discurso e política de privatização do sistema penitenciário
Ademais, junto ao discurso crescente de apoio a insegurança social e aumento de unidade prisionais com sucateamento de condições de trabalho, encontra-se em andamento no Congresso Nacional e com apoio do governo local, do modelo de privatização de setores das unidades prisionais, ou de unidade inteiras que passariam para gestão da iniciativa privada.
No mês de junho de 2017, em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), o tema Privatização da Segurança Pública voltou à tona com a discussão do Projeto de Lei do Senado (PLS) 513/11 que foi rejeitado. As Parcerias Público-Privadas, chamadas PPPs sempre levantaram discussões acaloradas de defensores que exemplificam seus “bons resultados” com experiências de outros países, principalmente dos Estados Unidos, onde estão estabelecidos metade dos presídios privatizados do mundo, cerca de 100. Entretanto, o país citado, hoje segue o caminho contrário: o da estatização.
Experiências de privatização no Brasil
Dentro deste cenário, o Brasil já possui algumas experiências desse tipo de gestão em estabelecimentos penais, mas ao contrário do que os defensores dessa chamada “solução” para o problema da segurança pública dizem, a prática não têm sido favorável. Sob a máxima “baixo custo e alta eficiência”, as PPPs desse nicho instauradas no Brasil a partir de 2013 em Minas Gerais, com Ribeirão das Neves, mostram-se ineficientes.
Que a Sistema Penitenciário brasileiro está um caos é um processo que não podemos negar. Problemas como superlotação, falta de funcionários, estrutura deficiente, geram a desumanização do agente penitenciário e do preso, impedindo a ressocialização do apenado, já que impede que o trabalho do agente seja realizado com toda a eficiência que poderia e deveria. Alguns atores sociais observam, com isso, a privatização do sistema como a saída para todos os males. Entretanto, sem observar que a realidade desse país é completamente diferente da inglesa e mesmo da norte-americana, por exemplo, esquecendo que a máxima de uma “empresa privada” não é o serviço prestado, mas o lucro. Sendo assim, a tal eficiência, provavelmente é substituída pela construção de presídios em massa. Nos documentos da PPP de Neves disponíveis no site do governo de Minas Gerais, fala-se inclusive no “retorno ao investidor”. Quanto mais presos, maior é o lucro. Não fosse assim, não seria uma empresa privada.
Patrick Lemos Cacicedo, coordenador do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria Pública de São Paulo, em entrevista ao site “Pragmatismo Político” afirmou que o maior perigo deste modelo é o encarceramento em massa.
“Nos Estados Unidos o que ocorreu com a privatização deste setor foi um lobby fortíssimo pelo endurecimento das penas e uma repressão policial ainda mais ostensiva. Ou seja, começou a se prender mais e o tempo de permanência na prisão só aumentou. Hoje, as penitenciárias privadas nos EUA são um negócio bilionário que apenas no ano de 2005 movimentou quase 37 bilhões de dólares”, explicou.
É de se pensar, que no caso do Brasil, um país com uma população carcerária de mais de 550 mil presos, sendo a quarta no ranking mundial, e que em vinte anos, entre 1992-2012, aumentou esta população em 380%, segundo dados do DEPEN, a tendência é encarcerar ainda mais.
Neste cenário de privatização o trabalhador do sistema penitenciário e seu trabalho assumem uma condição inferior já que sua condição de funcionário público, com obrigações e direitos relativas à função pública é posta de lado. A ideia central do modelo é abandonar a função do Estado e transformá-la em negócio, e nisto nossa categoria e o Brasil são sacrificados ainda, mais.
Governos atuais e o novo lobby para privatizar o sistema penitenciário
Como já noticiado pelo Sifuspesp, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei (PL) 2.694 de 2015 que, em suma, autoriza a execução direta dos mais diversos serviços realizados dentro das penitenciárias por trabalhadores de empresas terceirizadas - isto é, o processo de privatização do Sistema Penitenciário Brasileiro. No dia 2 de maio, a Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado retirou tal PL da pauta devido a uma intervenção política realizada pelo presidente da Federação Nacional Sindical dos Servidores Penitenciários (Fenaspen), Fernando Anunciação.
Por meio de negociação com os deputados federais, o presidente conseguiu a breve retirada do projeto em questão da discussão, entretanto o texto pode retornar. Este é um tema que preocupa ao Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo(Sifuspesp) e deve ser acompanhado em todos os passos por nossa categoria.
Neste momento estamos buscando alertar e informar a todos sobre esta ameaça e como isso pode gerar prejuízos para nossa categoria e para a sociedade brasileira. A preocupação da FENASPEN e SIFUSPESP tem o caráter de defesa de nossa categoria e do sistema penitenciário. Temos que nos apropriar dos avanços que obtivemos com o SUSP e com o avançado processo de reconhecimento da Polícia Penal para criar um Sistema Público Penitenciário Nacional com a definição de regras gerais nacionais e condições mínimas para a modernização do sistema de forma integrada nacionalmente. Mas temos diversas evidências da construção de um discurso que defenda a privatização do sistema através da crítica ao sistema penitenciário e usando o trabalhador penitenciário como bode expiatório, algo evidente em Brasília com o trabalho de lobistas no Congresso e no Amazonas com a articulação entre o governo e empresas norte americanas.