Por Fábio Jabá
Quando tomar posse, em primeiro de janeiro, Tarcísio de Freitas se tornará governador e, por quatro anos, o servidor público número 1 de São Paulo. Suas credenciais mais conhecidas são o currículo como engenheiro e capitão do Exército Brasileiro e pela experiência em áreas de infraestrutura dos governos Dilma e Bolsonaro.
Nós, policiais penais paulistas, damos as boas vindas ao govenador eleito, e acreditamos que ele, que assim como nós é um homem da segurança pública, terá o conhecimento e a vontade de mudar. Governador, infelizmente não trazemos boas notícias. Adiantamos: vai ser difícil.
Quando assinar o termo de posse, assinará junto a responsabilidade por um sistema prisional em frangalhos, que na ânsia de endurecer a punição a criminosos, se transformou em uma fábrica de servidores sobrecarregados, doentes e temerosos por suas próprias vidas. O ambiente de um presídio é sufocante para todos, incluindo os que não cometeram nenhum crime, e que ganham o sustento ali, cumprindo a missão de garantir a segurança de quem está do lado de fora das muralhas.
São Paulo tem o equivalente à população de uma cidade média, como Rio Claro, em população carcerária. São 198 mil detentos sob responsabilidade de 35 mil servidores, número baixo demais para que demandas básicas sejam supridas. Faltam profissionais de saúde, administrativos e policiais penais. Atualmente cada dois servidores fazem o serviço de três, em média. De um quadro total de 50 mil servidores, só temos 35 mil guerreiras e guerreiros que sentem medo, ficam doentes, mas não abandonam a missão de cuidar de um sistema apodrecido.
O sistema prisional é indispensável à inteligência policial, única forma efetiva de reduzir a criminalidade. Como em 2020, quando uma fuga do chefe da maior facção criminosa do país foi frustrada porque um policial penal da P1 de Presidente Bernardes encontrou o plano de fuga ao revistar uma cela. É comum que servidores vasculhem o esgoto e até as privadas de presos, em busca de armas, drogas e mensagens que serviram para iniciar grandes operações que prenderam traficantes de drogas, evitaram assassinatos de autoridades e grandes assaltos do chamado “Novo Cangaço”.
Enquanto isso continuamos esperando a regulamentação da Polícia Penal de São Paulo, dando fim a uma desobediência à Constituição que já dura três anos. Seguimos sendo policiais na prática, sem o reconhecimento e as garantias de direito, sem proteção à nossa segurança pessoal e a de nossas famílias. Formamos a primeira barreira entre um preso e o mundo exterior. Somos obrigados a informar a ele que não terá um atendimento por falta de servidores. Esse papel faz de nós o primeiro alvo de vingança.
Para pioraram, a falta de servidores chegou ao absurdo de encontrarmos, em maio deste ano, um único policial penal, DESARMADO, cuidando de 700 presos do semiaberto no Centro de Detenção Provisória de Franco da Rocha.
Não se espante, governador: nos presídios do semiaberto paulista, os policiais penais trabalham sem armas.
Armas que faltaram no Centro de Ressocialização Feminino de Rio Preto, quando cinco presas agrediram as únicas três policiais penais de um plantão, para depois fugirem com facilidade. Não à toa as unidades do regime semiaberto são consideradas mais perigosas para os servidores do que os presídios de regime fechado.
Os servidores do sistema prisional não reivindicam nada ao governador que chega em janeiro, a não ser o cumprimento de leis e regras constitucionais que já existem, como a regulamentação da Polícia Penal; a recomposição de servidores para atender ao Artigo 1º do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que estabelece o número mínimo de 5 policiais penais para cada detento, e o estabelecimento de critérios mínimos para a nossa data base em razão de exercermos função essencial e, por isso, sem direito à greve.
Nós, policiais penais, desejamos boa sorte ao seu mandato e nos colocamos à disposição para auxiliar na construção de um sistema prisional que cumpra seu objetivo de ressocializar quem um dia perdeu-se dos caminhos da Lei. Hoje, inaceitavelmente, o sistema é uma fábrica de criminosos.