Relatório elaborado pela FGV com base em pesquisa respondida por trabalhadores penitenciários também constata que maioria teve saúde mental afetada pela pandemia sem receber qualquer apoio para lidar com a crise, enquanto diz não haver estrutura para isolamento de detentos contaminados em meio a aumento da tensão entre os presos
por Giovanni Giocondo
Relatório divulgado nesta terça-feira(01) pela Fundação Getúlio Vargas(FGV) apontou que a maioria dos policiais penais brasileiros está com medo e diz não ter recebido treinamento adequado para enfrentar a pandemia do coronavírus dentro do sistema prisional. De acordo com a pesquisa intitulada “Impactos do COVID-19 no trabalho dos(as) policiais penais/agentes prisionais”, 79,1% dos entrevistados diz ter receio da doença, enquanto 20,9% não teme seus efeitos.
Em sua terceira fase - leia o resultado das segunda etapa aqui, o estudo feito com os trabalhadores penitenciários diz que 73,3% disseram que sua saúde mental foi afetada pela crise. Nesse sentido, somente 8,1% disseram ter recebido algum tipo de apoio para lidar com a crise enquanto que quanto a suas emoções pessoais, 61% relataram estar mais estressados, 52% mais ansiosos, 49% com mais medo, 40% mais cansados, 38% lidando com mais frieza em relação à vida e 31% mais tristes devido à pandemia.
Esses danos ao psicológico dos trabalhadores podem ser explicados por outro dado muito relevante coletado pela pesquisa. De todos os que responderam, 99% disseram conhecer um colega que teve diagnóstico confirmado para a COVID-19, e 82% sabe de algum preso de sua unidade que foi infectado.
Realizada entre 15 de setembro e 15 de outubro através de formulários online abertos aos profissionais de segurança pública de todo o país, o estudo também demonstrou que os policiais penais disseram estar preparados para lidar com a pandemia, apesar de não contar com a devida infraestrutura necessária ao enfrentamento do coronavírus dentro das unidades prisionais.
Para 69% dos trabalhadores, não há estrutura em sua unidade para isolar detentos doentes. Simultaneamente, 62,2% afirmaram não ter recebido orientações de seus superiores para lidar corretamente com a pandemia, apesar de quase 90% ter recebido treinamento com esse objetivo e 64,5% se sentir preparado para lidar com a crise. Somente 57,6% disse ter recebido equipamentos de proteção individual(EPIs) para se proteger.
Paralelamente, a testagem atingiu de forma contínua 61% dos policiais penais que responderam à pesquisa, 32% de maneira ocasional, enquanto 7% disse que nunca foi submetido a nenhum exame de detecção do vírus.
O relatório também destaca que entre os policiais penais, 77% relatou sensação de que os detentos estão mais tensos, sendo que 54,3% dos trabalhadores acredita que o principal motivo dessa tensão é o distanciamento social dos familiares. A outra razão que mais apareceu na pesquisa é o medo geral da doença tanto entre sentenciados quanto entre funcionários(27,1%).
A avaliação dos governos estaduais na gestão da pandemia também é considerada ruim por três em cada quatro policiais penais. No total, 78,5% consideram negativa a resposta da administração ao impacto que a pandemia teve sobre o sistema prisional, índice semelhante ao verificado no caso do suporte dos superiores, cuja percepção de baixa qualidade chega aos 72,2%.
Ainda de acordo com o relatório da FGV, 93% são contra a reabertura total das atividades econômicas no país sem a devida proteção. As respostas sugerem que 33% defendem a abertura com todos os protocolos de higiene, 30% apenas dos serviços considerados essenciais e outros 30% são contra a reabertura.
Recomendações da FGV às administrações estaduais
Como forma de minar o avanço da pandemia e de seus efeitos sobre os trabalhadores e os detentos, os pesquisadores da FGV fizeram uma série de recomendações aos gestores das unidades prisionais brasileiras com base no estudo. Para o grupo, o agravamento da crise “exige que políticas, recursos e investimentos sejam direcionados para manter a segurança e bem-estar dos(as) profissionais da ponta”.
Entre as propostas, está a manutenção da política da testagem em massa tanto dos trabalhadores quanto da população carcerária; a intensificação do fornecimento de equipamentos de proteção individual, e o avanço na sistematização de dados sobre infecções e óbitos causados pelo coronavírus, de forma regionalizada e por unidade prisional, como forma de facilitar o enfrentamento de uma segunda onda.
Os pesquisadores também recomendaram à administração dos Estados no setor penitenciário um fortalecimento da relação com os sindicatos de maneira a melhorar as condições de trabalho dos servidores, com a criação de ouvidorias para que os trabalhadores possam fazer denúncias sobre problemas em seu local de atividade laboral, entre outras orientações.
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