Desde que a Lei nº 15.552 foi sancionada, ou seja, desde a última terça-feira, dia 12 de agosto de 2014, o SIFUSPESP vem, insistentemente, solicitando um posicionamento por parte da SAP – Secretaria da Administração Penitenciária, no sentido de saber se as regras lançadas naquele dispositivo são autoaplicáveis ou não, ou seja, se já passam a valer as novas regras de imediato ou se somente passará a valer após 180 (cento e oitenta) dias.
A dúvida é pertinente na medida em que a Lei, em seu artigo 7º, estabelece que a lei “entra em vigor na data de sua publicação”, mas, em contrapartida, no artigo 5º, informa que “O Poder Executivo regulamentará a presente lei no prazo de 180 (cento e oitenta) dias a contar da data de sua publicação”.
Ao que parece, estamos, mais uma vez, diante de um exemplo claro de má redação legislativa, da qual se constam ambiguidades e obscuridades, gerando insegurança a toda Categoria.
Como se sabe, o Agente de Segurança Penitenciária – ASP possui como atribuições as “atividades de vigilância, manutenção da segurança, disciplina e movimentação dos presos internos em Unidades do Sistema Prisional” (Lei Complementar nº 498/86 e Lei Complementar nº 959/04).
Assim, caso deixe de proceder com as medidas necessárias a vigilância, manutenção da segurança e disciplina, responderá administrativamente e criminalmente.
Fato é que até hoje temos ordens e normas de como proceder nas revistas das visitas, sendo que se não a obedecermos, estaremos sujeitos as punições acima citadas.
Tais normas e regras estão disciplinadas, dentre outros, na Resolução SAP - 144, de 29-6-2010 (DOE de 30-6-2010 – pg. 18/21), que instituiu o Regimento Interno Padrão das Unidades Prisionais do Estado de São Paulo.
O Regimento prevê expressamente que:
SEÇÃO II
DA REVISTA ÍNTIMA CORPORAL
Artigo 156 - a revista íntima corporal, quando necessária, consiste no desnudamento parcial de presos e de seus visitantes.
§1º - o disposto no caput deste artigo deve ser adotado com a finalidade de coibir a entrada ou a presença de objeto ou substância proibidos por lei ou pela administração, ou que venham a por em risco a segurança da unidade.
Artigo 157 - a revista íntima corporal deve ser efetuada em local reservado, por pessoa do mesmo sexo, preservadas a honra e a dignidade do revistado.
§1º - É proibida a revista interna, visual ou tátil do corpo do indivíduo.
§2º - Nos casos em que após a revista íntima corporal, ainda haja dúvida quanto ao porte de objeto ou substância não permitidos, a entrada não deve ser autorizada.
§3º - na hipótese da ocorrência do previsto no parágrafo anterior deve haver:
I- encaminhamento do visitante a uma unidade de saúde para realização de exame;
II- condução do preso, a uma unidade de saúde para realização de exame, se necessário.
Artigo 158 - a revista íntima corporal deve ser efetuada no preso visitado logo após a visita, quando esta ocorrer no parlatório.
Todavia, chegou ao conhecimento da Diretoria do SIFUSPESP que em algumas Coordenadorias e Unidades Prisionais estaria havendo a ordem no sentido de que a Lei fosse cumprida desde logo.
Uma vez que a SAP não se pronunciou oficialmente, o SIFUSPESP solicitou ao seu Departamento Jurídico um posicionamento a respeito, tendo obtido o seguinte parecer:
Estamos diante de um problema recorrente, onde é questionada a validade ou não de Lei que necessita de regulamentação.
Este tema é conturbado e, via de regra, acaba desaguando no Judiciário, o qual decide se a Lei é ou não autoaplicável.
Analisando o caso em estudo, entendemos que a Lei nº 15.552/14 não é autoaplicável por várias razões:
Em primeiro lugar, o artigo 5º da Lei é expresso em estabelecer o prazo de 180 dias para sua regulamentação. Some-se a isso o fato de que o artigo 3º estabelece que as revistas íntimas serão substituídas pelos mecanismos eletrônicos ali listados.
Ora, é de conhecimento comum que as Unidades Prisionais do Estado de São Paulo não estão guarnecidas com referidos dispositivos.
A interpretação, assim, deve ser no sentido de que a intenção do Legislador foi a de que é necessário o prazo de 180 dias para se aparelhar as Unidades Prisionais e, então, possibilitar a aplicação da Lei.
Além do mais, haverá a necessidade, ainda, de se regulamentar como ocorrerá esta nova modalidade de movimentação de visitas nos presídios, dentre outras coisas.
Vale ressaltar que a própria ALESP traz em seu site orientação a respeito do tema (http://www.al.sp.gov.br/leis/legislacao-do-estado/leis-nao-regulamentadas/) onde deixa claro que a Lei que prevê regulamentação não é autoaplicável.
Neste texto, inclusive, se encontra a citação da doutrina do Prof. Miguel Reale, que diz: '...Uma lei não regulamentada, não obstante a regulamentação esteja nela prevista, acha-se desprovida de eficácia. Qualquer ato nela baseado incorre em inconstitucionalidade, uma vez que são feridos dois princípios constitucionais: o que diz que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, válida e eficaz'; e o de que 'ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal' (Constituição Federal, art. 5°, inciso LIV)".
Ressalte-se, ainda que em casos análogos o judiciário, por vezes, já foi instado a se manifestar e, na maioria das decisões, se verifica que é adepto da interpretação dada pelo doutrinador acima, ou seja, reconhece que a norma é de eficácia limitada.
Por fim, em buscas realizadas de notícias sobre o tema encontramos uma reportagem da Folha de São Paulo (http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/08/1499842-alckmin-veta-revista-intima-nos-presidios-de-sao-paulo.shtml) da qual consta que a SAP teria informado que irá implantar a Lei no prazo de 180 dias e que até lá o processo de revista permanecerá como antes.
Por todo o exposto e, uma vez que o ASP não pode deixar de cumprir seu mister de guarda e segurança dos presídios, entendemos que a malfadada Lei sancionada pelo Governador não possui eficácia plena, carecendo de regulamentação.
Assim, até que não ocorra esta regulamentação os Agentes de Segurança deverão proceder como prevê o Regimento Interno Padrão e demais normas específicas.
Por outro lado, caso sejam notificados formalmente por superior hierárquico para procederem de forma diferente, ou seja, para que deixem de realizar as revistas intimas, mesmo não existindo na Unidade Prisional os dispositivos eletrônicos capazes de realizar a verificação eficaz do corpo da visita, orientamos para que o Agente se posicione contrariamente, alegando se tratar de ordem manifestamente ilegal, bem como elabore um Boletim de Ocorrência informando todo o ocorrido, ponderando que, ao obedecer aquela ordem estaria colocando em risco a vida dos funcionários, assim como deixando de cumprir com suas atribuições.
Diante destas ponderações por parte do Departamento Jurídico, o SIFUSPESP orienta aos Agentes de Segurança Penitenciária a agirem da forma apregoada acima.
Por outro lado, o SIFUSPESP irá monitorar como será este final de semana e, em havendo entendimento contrário ao acima, proporá as medidas judiciais e/ou administrativas cabíveis. Por isso, caso algum Agente venha a sofrer quaisquer problemas referentes ao caso aqui tratado, mantenha contato com o SIFUSPESP informando o ocorrido.