SIFUSPESP
SINDICATO DOS FUNCIONÁRIOS DO SISTEMA
PRISIONAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
NOTA OFICIAL
O Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo vem a público esclarecer o seu posicionamento em relação às denúncias feitas por um suposto integrante de facção criminosa em reportagem do Jornal A Tribuna de Araraquara na data de 24 de julho de 2011.
Em primeiro lugar, deixamos claro que somos 33 mil servidores atuando no sistema prisional paulista. A maioria absoluta deste contingente é composta por pessoas íntegras, honestas, e que apesar dos baixos salários e das condições indignas de trabalho não se deixam corromper, e exercem efetiva e legalmente suas atividades, mesmo sem o devido reconhecimento por parte dos governantes e de parte da sociedade.
O problema da entrada ilegal de celulares dentro das unidades prisionais paulistas é uma questão de política de segurança pública a ser resolvido pelo Governo do Estado. O SIFUSPESP e a categoria não compactuam com o banditismo nem com a corrupção – prova disto é que na própria pauta de reivindicação os servidores cobram medidas ao Estado para prevenir ações criminosas nas unidades e punir a todos aqueles que as cometem.
É inverídica e simplista a informação divulgada pelo jornal de que “Ao contrário do que se imagina, não são as mulheres que levam os aparelhos para as unidades” e de que “Quem passa (os celulares) são os funcionários da unidade”. São absurdamente comuns – e o Estado tem conhecimento disto – as apreensões de aparelhos celulares com visitantes que tentam entrar nas unidades para repassá-los aos presos. Ainda assim, muitos desses aparelhos ainda conseguem ser introduzidos nas unidades graças a mil e um artifícios ilegais constantemente renovados.
O número de aparelhos de celular dentro das unidades ainda é alarmante. Mas é preciso que se diga que, se este número não é ainda muito maior, é graças ao trabalho honesto dos servidores do sistema prisional paulista, que semanalmente impedem a entrada de dezenas de aparelhos.
Infelizmente, existem raros servidores do sistema que se corrompem ao crime, assim como acontece com raros advogados e poucos familiares de presos que se arriscam e burlam a segurança na entrada das unidades prisionais a fim de levar celulares aos detentos. Para todos eles, o SIFUSPESP e a categoria dos servidores do sistema prisional paulista defende a aplicação rigorosa da lei: processo investigativo administrativo e policial, e punição exemplar.
Evitar esse tipo de crime depende da boa vontade do Estado. Questionamos a razão pela qual os governos não investem em tecnologia para detectar tais aparelhos de forma segura; não investem em capacitação para os servidores; não apuram com afinco as irregularidades descobertas; e não punem adequadamente os corruptos e corruptores. Há casos – não apenas um – de mau funcionário que foi flagrado cometendo esse tipo de crime e recebeu, como punição, a transferência para outra unidade prisional.
Há tempos que o SIFUSPESP denuncia ao Governo do Estado, através da Secretaria de Administração Penitenciária, que facções criminosas estão inserindo no quadro funcional da SAP criminosos ligados a ela, que passam por concurso público e conseguem trabalhar na segurança das unidades com o único objetivo de facilitar as ações criminosas das facções dentro das unidades prisionais.
Reiteramos: a categoria dos servidores do sistema prisional não compactua com criminosos. Por isso, solicitamos oficialmente ao governo que tomasse a providência básica de fazer uma avaliação social dos candidatos a servidores do sistema prisional – assim como é feito por candidatos a cargos na polícia – e das pessoas que pretendem exercer qualquer cargo de chefia no sistema prisional paulista. Ainda não obtivemos resposta efetiva do Governo do Estado quanto a esta reivindicação.
É preciso reconhecer que há corrupção também no sistema prisional. No entanto, combatemos veementemente a simplificação desta questão: é absurdo, leviano e irresponsável acreditar que o sistema prisional não funciona com perfeição por causa de seus funcionários.
Se há maus funcionários, que eles sejam detectados, investigados e punidos pelos seus crimes – essa parte é fácil de resolver, quando se quer.
Difícil de resolver, ao que parece, é implantar uma política de segurança efetiva: com tecnologia que impeça a entrada de produtos ilegais; tecnologia que impeça o uso de celular dentro das unidades; investimento em salário e condições de trabalho para o servidor; investigação preventiva, inteligente e imparcial; com ações que realmente visem ressocializar os presos; e uma política de segurança que faça frente à organização cada vez maior da criminalidade no Estado de São Paulo.
A criminalidade precisa ser enfrentada com coragem e ações. Lembramos à sociedade que as primeiras vítimas do sistema prisional falho que temos hoje somos nós, servidores do sistema prisional. Lembramos, por fim, que os maiores interessados em um sistema prisional justo e digno não são os presos, que passam alguns anos encarcerados. Os maiores interessados somos nós, obrigados a trabalhar cotidianamente num ambiente insalubre por, pelo menos, 25 anos antes da aposentadoria especial – “benefício” só conquistado pela categoria no ano passado.
SIFUSPESP
Diretoria
São Paulo, 25 de julho de 2011
Abaixo, leia a matéria publicada pela Tribuna Impressa de Araraquara:
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Domingo, 24 de Julho de 2011 às 03h00
Presos compram celular por R$ 10 mil dentro da prisão
Ex-detento diz que aparelhos entram por meio de funcionários; preço varia de acordo com uma função: a câmera
Por Cláudio Dias
Um aparelho celular, que nas lojas da cidade podem ser comprados por R$ 200 a R$ 2 mil, dependendo do modelo e das funções que oferece - acesso à internet e tamanho da memória, por exemplo -, dentro do sistema prisional são adquiridos por valores entre R$ 8 mil a R$ 10 mil. A variação nos preços depende da função câmera.
As informações foram passadas com exclusividade à Tribuna por um homem recém-egresso do Centro de Detenção Provisória (CDP) de Araraquara, complexo que integra a Penitenciária. Durante semanas, por meio de um intermediário, a reportagem negociou a entrevista exclusiva com o ex-detento, integrante da facção Primeiro Comando da Capital (PCC). A condição foi que nenhum dado pessoal fosse revelado, para evitar retaliações.
Nessa conversa, ele abriu o jogo e contou detalhes e falhas do sistema. "Celular na mão da gente pode ser uma arma", sentencia.
Ele conta que o último celular que teve como interno não tinha câmera. "O meu era simples e valia R$ 8 mil", conta o jovem, que negociou o "radinho" com outro detento ao ganhar a liberdade.
Ao contrário do que se imagina, não são as mulheres que levam os aparelhos para as unidades. Segundo o ex-detento, o sistema de segurança instalado hoje detecta facilmente os celulares, por isso, eles têm que recorrer a outro caminho: "Quem passa são os funcionários da unidade. Eles dão uma força." E faz outra revelação: "Eles fazem muita vista grossa. A maioria não faz mais nada, não".
No mês passado, um ex-agente de Araraquara foi preso em Bauru por tentar entrar na Penitenciária 2 da cidade com oito aparelhos. Ele tinha sido transferido em 2008 pelo mesmo crime - corrupção passiva.
Como o risco para levar um aparelho para dentro do sistema é grande, o valor também é alto. Mas lá, diz o homem, para tudo "dá-se um jeito" e nada é por caridade. Ele conta que o celular é o objeto de desejo de dez em cada dez internos. Quem compra, pode "alugar" e cobrar dinheiro por isso, apesar de a prática não ser a mais comum. Geralmente, os minutos de conversa são pagos com créditos, ou seja, o usuário carrega um valor, gasta uma parte e deixa o restante para o dono do aparelho. "Cada um, cada um. Eu não gostava de emprestar porque não sei se vão passar o número para a diretoria."
Silêncio
A reportagem procurou a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária com questionamentos sobre a entrada de celulares nos presídios por meio de funcionários e o uso atrás das grades. No entanto, em nota oficial, a única resposta do órgão foi que não irá se manifestar sobre o assunto.
Crimes são organizados de dentro da cadeia
O telefone é usado para muitas coisas n aunidade prisional: conversar com a família, fazer acordos de facção e negócios ilícitos. "Já usei para muita coisa, mas não para rebelião ou coisas assim. Só de tráfico mesmo e para controlar as coisas, porque tenho meus negócios, né. Mas nas bocas, você sabe!", conta o ex-interno, que admite ter acompanhado assaltos e auxiliado na formação de quadrilhas. "A gente faz assalto. Entre nós, ‘bola’ quatro ou cinco caras. Aí, os parceiros que estão na rua montam um time para assaltar também", conta ele.
Ele detalha o esquema: "Eu tenho um parceiro. Aí outro parceiro tem um carro e o outro tem as armas. Eles vão fazer o assalto na rua, mas a gente acompanha de dentro."
Muitos dos alvos são passados por acertos de dívidas, ou seja, alguém com alguma pendência com o grupo entra em contato e dá a dica de onde e como roubar. "Tem muito cara da rua que vai procurar a gente para resolvermos os problemas. Quando eu estava lá dentro, resolvia, aí ele passava a ‘caminhada’. Assim: o cara conhece o dono de um supermercado, sabe que ele recolhe o dinheiro tal dia e que tal dia ele pega tantos mil. Aí, ele passa tudo certinho e a gente monta o time para ir lá roubar."