Os conflitos envolvendo o sistema prisional maranhense, posto à vista do público mundial nos últimos dias, infelizmente retratam uma situação caótica que se espalha por todo o país – inclusive no estado mais rico da nação. Em São Paulo, os servidores do sistema prisional se encontram em estado de greve desde novembro. A greve pode ser deflagrada a qualquer momento, já que os problemas fartamente denunciados pelos funcionários não são sequer dialogados com o governo, que se nega a ouvir os representantes sindicais da categoria.
Em São Paulo, paga-se um dos piores salários a agentes penitenciários. Enquanto no Maranhão, segundo a revista Istoé (http://gilbertolimajornalista.blogspot.com.br/2014/01/de-isto-e-barbarie-brasileira-violencia.html) o salário de um agente é de R$ 5 mil, em São Paulo o salário máximo, para agentes de último nível da classe, e acrescido de gratificação, chega a R$ 3,4 mil. Poucos conseguem receber esse valor. O menor salário, também incluindo gratificação, é de R$ 1,6 mil; na média, a maioria recebe em torno de R$ 2 mil (ver tabela salarial em http://www.sifuspesp.org.br/index.php/materia-2/1564-010812reajuste.html).
A superlotação carcerária, questão que respalda a maioria das revoltas dos presos, bate recordes em São Paulo. São 158 unidades prisionais no estado, e todas estão com lotação acima de sua capacidade. Em outubro passado a SAP divulgou os números da população carcerária e evidenciou que 16 unidades já tinham uma lotação três vezes maior que sua capacidade. O CDP I de Osasco era, na ocasião, o mais superlotado: com capacidade para abrigar 768 presos, estava abrigando 2.673 detentos.
Não à toa, a profissão de agente penitenciário é considerada uma das mais estressantes do mundo. Além das péssimas condições de trabalho, há sempre o risco de agressões e violências de todas as formas.
Se no Maranhão os presos chocaram o mundo com denúncias de agressão física por parte dos agentes, em São Paulo essa situação se reverte: são os presos que agridem cotidianamente os funcionários. Nos últimos três dias, por exemplo, o SIFUSPESP recebeu denúncia de 4 casos de agressão a servidores. Os funcionários andam tão temerosos que alguns sequer denunciam formalmente seus agressores, temendo represálias. E quem pensa que só os presos do sexo masculino são agressores, não conhece a realidade dos presídios femininos, onde as agressões são ainda mais comuns.
Na Penitenciária de Iperó houve uma agressão a servidor dia 28 de dezembro. Os agressores seriam penalizados com 15 dias de isolamento sem receber visitas. No entanto o diretor da penitenciária resolveu anistiar os presos, liberando-os da punição, mesmo sendo reincidentes. Isso revela outro problema sério no sistema: assédio moral, excesso de discricionariedade e abuso de poder por parte de chefes e diretores (cargos comissionados do governo) em detrimento aos direitos dos funcionários, piorando ainda mais a sensação de insegurança no serviço. Servidores que reclamam de seus diretores são transferidos para outros municípios sem nenhuma justificativa, de um dia para o outro.
Isso sem falar no poder dos presos, agrupados em facções criminosas – uma mais violenta e repressora que a outra. As facções são comumente retratadas como “entidades” de “benefícios e organização” dos presos. A realidade, porém, é outra. As facções impõem regras no funcionamento das unidades prisionais, no comportamento dos presos, mas também são elas que autorizam ou determinam as agressões a funcionários, assassinatos dentro e fora das unidades, os motins, as rebeliões, a fabricação de armamentos feitos com materiais comuns; obrigam centenas de pessoas a se arriscarem a ser presas para levar-lhes drogas e armas – quanto a esta informação, basta ver nos presídios paulistas quantas das mulheres estão presas ali por tentarem entrar com armas ou drogas em presídios masculinos.
ESTADO DE GREVE
A situação no Maranhão é péssima e exige ações de curto, médio e longo prazo. Mas no restando do país a realidade é a mesma. Em São Paulo a situação chega a ser muito pior.
E se no Maranhão há um governo que vira as costas para o sistema prisional, o que se pode falar de São Paulo? Há um governo que não negocia com os trabalhadores, nem sobre a questão salarial, nem sobre condições de trabalho. Um governo que não ouve as reivindicações dos trabalhadores que há anos denunciam as mazelas do sistema e cobram uma política prisional séria no estado, incluindo investimentos em pessoal e em tecnologia.
Os servidores do sistema prisional paulista se reuniram em 13 de novembro passado na sede do sindicato da categoria, o Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo, e, em assembleia, decretaram estado de greve. Isso porque o governo sequer conversou com seus representantes sobre as reivindicações feitas no sentido de melhorar salário, condições de trabalho, e elaborar um plano sério para o sistema. A greve pode ser deflagrada a qualquer momento.
Um pesquisador da USP, Psicólogo Arlindo Lourenço, apresentou uma tese sobre as condições de vida e saúde dos agentes do sistema prisional paulista (confira em http://www.ip.usp.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=2170:expectativa-de-vida-de-agentes-penitenciarios-e-de-45-anos&catid=44:noticias&Itemid=95). Com as pesquisas realizadas, conclui que a expectativa de vida do agente prisional paulista é de meros 45 anos. Mais: tratou da questão dos afastamentos por questão de saúde e conseguiu estipular que cerca de 10% dos agentes estão afastados das funções por problemas de saúde, geralmente ligadas a danos psicológicos e psiquiátricos decorrentes do trabalho que desenvolvem.
As questões levantadas pelo pesquisador desde então endossam as principais reivindicações da categoria nas negociações de campanha salarial. São tantos os problemas dos trabalhadores que o SIFUSPESP reparte a sua pauta de reivindicações em duas: a salarial e a de condições de trabalho (http://www.sifuspesp.org.br/index.php/materia-2/1516-180612pautas.html e http://www.sifuspesp.org.br/index.php/materia-4/1672-02012013-sifuspesp-protocola-pauta-da-campanha-salarial-2013-na-sap.html).
Outro dado mórbido: em 2013 seis agentes penitenciários foram brutalmente assassinados nas ruas (fora das unidades). Não se sabe do resultado da apuração desses crimes, e quantos deles aconteceram por retaliação ao serviço que prestam à sociedade.