Quando o interesse público vira negócio

 

Após uma fuga em  massa do Centro de Detenção Provisória Masculino II (CDPM 2), em Manaus/AM. no último sábado, 12/05, o governador do Estado veio à público nesta terça-feira (15/05) dar declarações a respeito do que será feito em relação a fuga dos 35 detentos membros de facções criminosas rivais da região. Além disso, existe o agravante da acusação sob diretoria do CDPM 2 de ser facilitadora da fuga.

Em coletiva de imprensa, o governador Amazonino Mendes afirmou que o sistema prisional é “frágil e cheio de defeitos”. Fez menção ao massacre de 2017 e fez promessas como construir um presídio de segurança máxima e criar um banco de DNA. Segundo ele, o financiamento para tais projetos estaria praticamente resolvido. Entretanto, em entrevista para o SIFUSPESP, o presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciário do Estado do Amazonas (SINSPEAM), Antônio Jorge de Albuquerque Santiago, afirmou que o sistema encontra-se neste estado, justamente pela falta de investimentos da parte do governo amazonense.

“O governo do Estado do Amazonas não investiu nenhum centavo depois do massacre que houve no regime fechado, em janeiro do ano passado. Não investiu em material humano, não fez concurso público, não aprovou nosso plano de carreira, cargos e salários, cortou nosso ticket alimentação e ainda quer aumentar o número de unidades terceirizadas”, afirmou Santiago.

O presidente do SINSPEAM lembra que foram criadas comissões especiais na Câmara dos Deputados do Amazonas para apurar os procedimentos administrativos relacionados a fuga e outras situações onde a empresa terceirizada que administra alguns presídios do Estado - a Umanizzare - atua.

“Foram aplicadas multas, principalmente devido a fuga, quando mais de 170 presos escaparam. Foi a maior fuga do Brasil. No contrato da empresa com o Estado é especificado que é necessário passar por um procedimento e aplicar a medida cabível, em casos como este. Foram aplicadas multas que chegaram a 24 milhões pela gravidade da situação. A Umanizzare não pagou um centavo até hoje para o governo do Estado do Amazonas”, denuncia.

Conforme matéria de março deste ano do portal G1, o Ministério Público do Amazonas (MPC-AM) pediu esclarecimentos à Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP) em relação a renovação de contrato com a empresa Umanizzare. Ainda segundo a matéria, no relatório do MPC, a Umanizzare  “cobra R$ 4,7 mil reais para cuidar de de um detento - praticamente o dobro do que um preso custa em média no restante do país”. E segundo o mesmo relatório, o Estado gasta 80% do orçamento da Seap com a terceirizada.

https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/mpc-pede-que-governo-do-am-esclareca-renovacoes-de-contratos-com-umanizzare-no-valor-de-r-845-milhoes.ghtml

A indignação do presidente do sindicato ocorre em virtude do gasto com uma empresa que à olhos vistos administra muito mal as unidades prisionais com as quais estabeleceu contrato. Rebeliões, mortes e fugas têm sido a demonstração disso.

“Um promotor de Manaus chegou a afirmar que a terceirização é um ralo para a corrupção. Será que se os políticos ouvindo isso de mim, lendo as matérias sobre o assunto, ouvindo a promotoria ainda vão aprovar a terceirização do Brasil? Existem muitas pessoas ganhando milhões com esses contratos milionários com a empresa Umanizzare com o Estado, principalmente no Amazonas”, relata.

Ainda segundo matéria do acritica.com de abril de 2017, para o MP-AM, entre os fatores que contribuíram para o colapso do sistema prisional está “a execução deficiente dos contratos das empresas terceirizadas, além de ter sido identificado o descumprimento de vários itens contratuais”. https://www.acritica.com/channels/manaus/news/relatorio-do-mp-aponta-falhas-que-levaram-ao-massacre-no-sistema-prisional-do-am

Esperança para o Sistema Prisional

“Espero que os políticos, que pensam que a terceirização dá certo, mudem de pensamento, porque aqui no Amazonas nós temos passado pelos piores momentos que o sistema penitenciário já atravessou durante todo esse tempo que tenho trabalhado aqui: 36 anos. E principalmente nas empresas terceirizadas”, afirma Santiago.

Segundo o presidente do sindicato, o governo do Estado do Amazonas não realiza concurso público há 36 anos. “É como se tivesse aberto mão do sistema penitenciário em detrimento de contratos milionários que têm resultado em verdadeiros desastre".

E segue: “Nós (categoria) somos o Estado dentro do sistema prisional. Não vamos aceitar o dinheiro público sendo levado para paraísos fiscais por pessoas inescrupulosas que deixam o servidor penitenciário sem um salário digno, sem uma aposentadoria justa, sem um plano de cargo, carreira e salário, passando necessidade, trabalhando no meio de pessoas perigosas, no meio de facções, sem um armamento, sem nada. Eles nos pagam para sermos reféns”, lamenta.

O sindicalista diz que a esperança do servidor público do sistema prisional do Amazonas é investimento da parte do Estado e a rescisão do contrato com a terceirizada.

“Que ela pague o que deve para o governo do estado do Amazonas, que o governo faça concurso público, que invista no sistema, na estrutura e no servidor. Tenho 36 uma vida dedicada ao sistema penitenciário e gostaria de ver um dia isso funcionar. É o sonho de todo servidor penitenciário: ver o sistema funcionar adequadamente, humanamente, para o resgate de pessoas à sociedade. E se houver investimento vai ter retorno sim. Isso depende de um governador que enxergue o futuro”, finaliza.

 

O SIFUSPESP apoia a categoria de servidores penitenciários no estado do Amazonas e observa com tom bastante crítico estes acontecimentos, sua relação com a privatização de nosso setor e o lobby que tem sido denunciado como ocorrendo em Brasília.